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Mercado de Escravos, Debret. |
Além disso, seu avô, Erasmus Darwin, tinha sido um médico respeitado na
Inglaterra, com vários livros publicados sobre medicina, filosofia natural e
poesia. Sua obra de destaque, Zoonomia, de 1792, abordava aspectos acerca da
evolução - a transmutação das espécies - tendo antecipado os mecanismos de
seleção, sendo grandemente admirada mais tarde por seus netos, Charles Darwin e
Francis Galton.
Porém, Darwin não desenvolveu um trabalho isolado, pois em todos os
portos a que chegava enviava correspondência e amostras de coletas geológicas e
biológicas para serem identificadas e estudadas por especialistas destas áreas.
A viagem do Beagle prevista para durar 2 anos foi concluída em 4 anos e
9 meses. Ainda no início da viagem, em 1832, Darwin passou 19 dias na Bahia e 3
meses no Rio de Janeiro, onde teve um
contato mais direto com a escravidão negra.
Posteriormente, na volta para Inglaterra o Beagle voltou à Bahia no dia
1º de agosto de 1836, onde ficou por seis dias, partindo daí com destino a Cabo
Verde, mas teve ainda que permanecer no Recife entre os dias 12 e 19 de agosto,
em função de ventos contrários. Foi no Recife que ele ouviu os gritos de um
escravo sendo trucidado.
Desde antes da viagem do Beagle e contemporaneamente a ela, havia um
grande debate científico entre ciência e religião, com predominância da crença
no criacionismo e a busca de argumentos para colocar os nãos caucasianos, como
negros e índios, num patamar abaixo do “ser humano”, tornando a escravidão tão
aceitável quanto eram a pecuária e a agricultura, que permitem aos homens utilizar-se
de outros seres vivos para atenderem suas necessidades de sobrevivência.
Todavia, Darwin não compartilhava desse ponto de vista, em boa medida
influenciado por seu avô que era partidário da Society for Effecting the Abolition of the Slave Trade, ou seja um
abolicionista. Desse modo, nesta parte do diário Darwin expressa seu profundo
desgosto pelos maus tratos infligidos por alguns escravagistas aos seus
escravos, ao contrário do que havia presenciado na fazenda do Sr. ManuelFiguireda.
Os maus tratos aos escravos influenciaram seu desejo de não mais voltar
ao Brasil após seu retorno à Inglaterra. Tal decisão se atribui, especialmente,
ao caminho de volta, após quase cinco anos viajando numa embarcação sem os
recursos ou confortos dos transatlânticos modernos, cansado e já com a saúde
debilitada, ao escutar os gritos de um escravo sendo martirizado em Recife.
Contudo, após o retorno à Inglaterra, as viagens de Darwin se resumiram,
basicamente, a períodos curtos na própria ilha da Grã-Bretanha.
A próxima parte de seu diário relata, portanto, os aspectos aviltantes
da escravidão, analisados por um jovem de 23 anos de idade, partidário da
igualdade entre os homens e originário de um país, cujo Ato de Abolição da
Escravatura seria aprovado em 1833, um ano após sua estada no Brasil.
Darwin: “14 de abril de 1832. - Deixando Sossego,
dirigimo-nos a outra propriedade, no Rio Macaé, o último pedaço de chão
cultivado nesta direção. A fazenda contava quatro quilômetros de comprimento,
mas o proprietário tinha esquecido quanto media de largura. Apenas pequena parte
tinha sido roçada, entretanto cada alqueire era capaz de produzir todas as
riquezas de uma terra tropical”.
Darwin: “Levando em conta a vasta superfície do
Brasil, insignificante é a área cultivada, quando comparada a enorme extensão
abandonada ao estado de natureza selvagem. Numa era futura, que população
imensa este país não sustentará”!
Darwin: “Durante o segundo dia da nossa jornada,
encontramos a estrada tão fechada que se tornou preciso mandar um homem à
frente, de facão, a fim de abrir passagem no cipoal. Lindos objetos se viam em
profusão na floresta. Dignos de admiração eram os fetos que, embora pequenos,
ostentavam nas curvas elegantes de sua fronde uma folhagem verde e brilhante”.
Nota: ‘Fetos’ era uma denominação utilizada no tempo de Darwin para
designar as samambaias, pois o desenvolvimento das folhas passa por uma etapa
que lembra a aparência de um feto de vertebrado, como mostra a figura abaixo.
Darwin: “À tarde choveu muito, e senti bastante frio,
apesar do termômetro marcar 18°C. Logo que parou de chover, foi curioso
observar a extraordinária evaporação que começou a ocorrer sobre toda extensão
da floresta. A uma altura de trinta metros, as colinas desapareciam em densa
neblina branca, que se erguia como colunas de fumaça saindo das partes mais
cerradas da mata, especialmente dos vales. Observei o mesmo fenômeno em várias
ocasiões, e suponho que seja devido à grande superfície de folhagem aquecida
pelos raios solares”.
Nota: A neblina após a chuva numa floresta tropical, como foi observada por Darwin no interior do estado do Rio de Janeiro, ainda pode ser contemplada na floresta amazônica, como na imagem abaixo.
Nota: A neblina após a chuva numa floresta tropical, como foi observada por Darwin no interior do estado do Rio de Janeiro, ainda pode ser contemplada na floresta amazônica, como na imagem abaixo.
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Neblina na floresta amazônica. |
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Outra gravura de Debret, que mostra a compra de uma criança, separadamente de seus familiares. |
Nota: o ferry tratava-se de
uma balsa.
Referências:
1- Charles
Darwin. Viagem de um Naturalista ao
Redor do Mundo - Vol.1, Nova edição, 1871. Abril Cultural. Companhia Brasil
Editora, São Paulo, s/d. Tradução de J. Carvalho.
2- Antonio Carlos Sequeira
Fernandes & Vera Lucia Martins de Moraes. O Retorno Impossível: Charles Darwin e a Escravidão no Brasil http://www.anuario.igeo.ufrj.br/anuario_2008_1/2008_1_65_82.pdf
3- Leonardo Castro. Escravidão e Resistência no Brasil, Nova Hitória
Net, 2009. http://novahistorianet.blogspot.com.br/2009/01/escravido-e-resistncia-no-brasil.html
4- TV-Escola: Edição especial: caminhos de Darwin, ano XIX, boletin 16,
Nov/2009. http://www.tvbrasil.org.br/fotos/salto/series/19282316-CaminhosDarwin.pdf
5- Wikipedia. Erasmus Darwin. http://pt.wikipedia.org/wiki/Erasmus_Darwin
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