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Darwin e a fuga das galinhas, versão Blogpaedia |
Neste trecho do seu diário, Darwin estabelece uma comparação entre o “Velho Mundo” com sua arquitetura elaborada e o “Novo Mundo” com suas construções incipientes. Além disso, ele se agasta um pouco com o clima tropical, já que havia crescido e vivido até então em terras mais frias.
Havíamos deixado na parte anterior um Darwin que ficara entristecido e melancólico, em virtude do horror à escravidão negra no Brasil. O relato escrito em 9 de abril de 1832, mostra que amanheceu ainda melancólico, mas aos poucos a beleza das aves e vegetação foi amainando sua escrita.
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Garça no mangal por land.nick |
Abaixo Darwin se equivoca ao chamar plantas epifíticas de parasitas, provavelmente porque o conceito de inquilinismo ecológico não estivesse bem estabelecido no tempo em que visitou um Brasil ainda no seu período Regencial, esperando a maioridade de D. Pedro II.
Darwin: As poucas árvores atrofiadas que se viam estavam cobertas de plantas parasitas, entre as quais se podiam admirar a beleza e deliciosa fragrância de algumas orquídeas.
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Foto de Isaias Malta. |
Darwin: Depois de nascido o sol, o dia tornou-se intoleravelmente quente, e a areia branca, refletindo a luz e o calor, causou-nos intenso mal-estar. Almoçamos em Mandetiba, com o termômetro marcando 28 °C à sombra. A vista maravilhosa que se contemplava da venda muito nos reconfortou. Daí, viam-se morros distantes, cobertos de arvoredos, que se espelhavam nas águas tranquilas de uma extensa lagoa.
Darwin: Aquela venda era ótima, deu-me uma reminiscência agradável, se bem que vaga, de um excelente almoço; farei a seguir, a fim de provar minha gratidão, a sua descrição como típica no gênero. Essas casas espaçosas por vezes, são construídas com postes verticais entrelaçados de ramos que são, depois, rebocados. Raramente possuem soalho, janelas com vidraças, nunca. São, entretanto, geralmente, muito bem cobertas. Como via de regra, a parte da frente é toda aberta, formando uma espécie de alpendre, em cujo interior se colocam mesas e bancos. Os dormitórios são contíguos de cada lado, e neles os hóspedes podem dormir com o conforto que oferecem uma plataforma de madeira e um magro colchão de capim.
O estilo das construções descritas por Darwin ainda guardam reminiscências como podem ser vistas num rancho de pau a pique e sapê.
Interior do Rancho de pau-a-pique, 2006. |
Como se não bastasse a rudeza dos alojamentos, nosso naturalista descreve ainda algumas agruras para poder comer...
Darwin: “A venda fica num
pátio, em que se alimentam os cavalos. Costumávamos, ao chegar, desarrear os
animais e dar-lhes a ração de milho. Em seguida, curvando-nos reverentemente,
pedíamos ao senhor que nos fizesse o favor de ar qualquer coisa que comer.
- Qualquer coisa que quiserem, senhores! Era a sua resposta habitual. Nas
primeiras vezes, dei em vão graças à providência, por nos haver guiado à
presença de tão amável pessoa. Prosseguindo o diálogo, porém, o caso
invariavelmente assumia o mesmo aspecto deplorável: - Pode fazer-nos o
favor de servir peixe? - Peixe! Não, senhor. - Sopa? -
Não, senhor. - Carne seca? - Oh! Não, senhor!”
Isso parece ruim, mas só piora...
Darwin: “Se tivéssemos sorte, esperando umas duas horas,
poderíamos conseguir frangos, arroz e farinha. Não raro, tivemos que, pessoalmente,
abater com pedradas as galinhas que nos iam servir para o almoço. Quando
extenuados de cansaço e de fome, dávamos a entender que ficaríamos satisfeitos
de ver a mesa posta, a resposta pomposa usual, se bem que verdadeira, mas assaz
desagradável, era: - Fica pronto, quando estiver pronto. Se ousássemos
insistir mais, mandar-nos-iam seguir viagem, por sermos tão impertinentes”.
Houve mudança deste cenário em Campos Novos, porém ainda registra a rudeza de outro comerciante ao sentir-se acusado de roubo...
Darwin: Em Campos Novos, porém, passamos suntuosamente, sendo-nos aí servido, ao almoço, arroz, frango, bolachas, vinho e licor; pela manhã serviam-nos peixe com café, e à tarde, café simples. Tudo isso, inclusive ração para os cavalos somente nos custou dois shillings e meio por pessoa. Não obstante, quando perguntamos ao dono se acaso sabia alguma coisa sobre o relho que um membro da nossa comitiva havia perdido, respondeu com brutalidade: - “Que sei eu? Por que não guardaram? É capaz dos cachorros terem comido”.
Felizmente, do Brasil império aos dias de hoje, houve muita mudança na hospitalidade carioca, pois o Rio de Janeiro é considerado uma das cidades do Mundo, onde os turistas são mais bem recebidos. Na última vez em que o visitamos, em 2001, pudemos comprovar este fato, assim como várias outras pessoas que classificam-no, essencialmente, como Cidade Hospitaleira.
Referência:
Darwin, C., Viagem de um Naturalista ao Redor do Mundo - Vol.1, Nova edição, 1871. Abril Cultural. Companhia Brasil Editora, São Paulo, s/d.
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