08 setembro, 2012

A natureza social do homem e a criação das leis, segundo Aristóteles.

Detalhe da obra “O casamento” de Jan Steen
Inegavelmente o homem, como todas as coisas, é um produto natural, porém Aristóteles admite que o comportamento humano extrapola tais limites, do contrário ele teria caído em contradição com a visão grega de um universo altamente organizado, preciso e previsível, observável nas ciências naturais da época e no movimento dos astros, uma vez que “As ações boas e justas que a ciência política investiga parecem muito variadas e vagas, a ponto de se poder considerar a sua existência apenas convencional, e não natural. (1094 b 16)”.


A existência convencional dessa ciência abarca a imprevisibilidade e inexatidões humanas, uma vez que os mesmos bens tanto podem ser benéficos a alguns, quanto maléficos a outros: “Os bens parecem igualmente vagos, pois para muitas pessoas eles podem ser até prejudiciais; com efeito, algumas pessoas no passado foram levadas à perdição por sua riqueza, e outras por sua coragem. (1094 b 19)”, que são bens reputados como altamente necessários para a obtenção de excelências morais.

A convenção também tornou possível a existência do dinheiro,  “... mas o dinheiro se tornou por convenção uma espécie de representante da demanda; ele tem este nome (nômisma) porque existe não por natureza, mas pela lei (nomos), e porque está em nosso poder mudá-lo e torná-lo inútil. (1133 a 30)”.

Assim, a lei também é o resultado de convenções e assim sendo, torna-se relativa aos lugares em que é aplicada, pois: “de maneira idêntica, as coisas que são justas não por natureza mas por decisões humanas não são as mesmas em todos os lugares, já que as constituições não são também as mesmas, embora haja apenas uma que em todos os lugares é a melhor por natureza. (EN,1135 a 10)”.

Isto não exclui a existência de uma justiça natural, já que a “A justiça política é em parte natural e em parte legal; são naturais as coisas que em todos os lugares têm a mesma força e não dependem de as aceitarmos ou não, e é legal aquilo que a princípio pode ser determinado indiferentemente de uma maneira ou de outra, mas depois de determinado já não é indiferente...(EN, 1134 b 25)”.

Recorrentemente, Aristóteles retoma à dualidade entre natural-imutável e convencional-mutável, e a justiça por seu caráter ambíguo será tão mutável quanto menor for sua parte natural. Quanto maior for o peso das decisões humanas na feitura de uma constituição, pior ela será, já que “as coisas que são justas não por natureza, mas por decisões humanas não são as mesmas, embora haja apenas uma que em todos os lugares é a melhor por natureza. (EN,1135 a 10)”.

Péricles via República Digital

O surgimento das constituições foi decorrência da existência política. As leis são escritas e reformadas para regrar a convivência dos que se associam e, para Aristóteles a sociedade surge por mérito da natureza humana “pois o homem é por natureza um animal social. (EN, 1097 b 8)”.

Assim o gênero humano oscila entre os extremos da dualidade natural/convencional e o pensamento ético contempla essas movimentações. Hoje, o peso da herança aristotélica é determinante na formulação, na recepção e na aplicação das leis. Acredita-se que a aceitação delas seja tão maior quanto maior for sua “organicidade”. Esta é outra maneira de denominar o componente natural de uma lei, ou seja, a sua aproximação à lei natural, que é a única plenamente aceitável em todas as geografias.

Por Isaías Malta

Referência:
ARISTÓTELES. Ética a Nicômacos. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1985.

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