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Juno e Júpiter por Gavin Hamilton |
Em Ética a Nicômacos de Aristóteles as várias formas de
excelência moral são o fio condutor, e o bem supremo é a vida de contemplação, e
a “eudaimonia”(felicidade), é o objetivo último do homem.
Não sendo um tratado sobre ciências naturais (palco adequado
para a discussão da criação do universo), a natureza é usada como categoria. Apesar do seu afastamento do interesse
principal em um tratado de ética, a conceituação de natureza e de natural fornece
material valioso sobre a origem das especulações éticas.
A atual noção de natureza não difere substancialmente
daquela postulada por Aristóteles. Como resultado da entronização do pensamento
grego na forma de pensar o mundo, os debates nos diversos campos da ética contemporânea
apresentam uma base filosófica que em nada destoa daquela de que Aristóteles se
serviu.
Até hoje não se tem noção clara de onde termina o natural e
começa o meramente humano, ou se as intervenções humanas, sendo o homem essencialmente
produto da natureza, nunca poderiam ser definidas como supra naturais.
Na área de educação, formalmente se baniu o conceito de
“inteligência natural”, mas na prática escolar a crença de que há alunos bons e
maus “por natureza”, não foi erradicado. O libelo das religiões contra os
métodos contraceptivos é baseado em “crimes contra a natureza”, contra a
natureza do corpo humano. Nesse mesmo caminho vão as ONG’s de cunho ecológico,
que sustentam a mesma categoria de crimes, contra a natureza do planeta.
Expus até aqui três tipos de natureza: a do homem envergando
suas potencialidades herdadas, a do corpo físico e a planetária.
Além disso, a noção de natureza abarca tudo aquilo que está
posto aí, aquilo que não sofreu a intervenção humana.
A existência dessas instâncias força a categorização das potenciais
formas de agir, determinando as ações boas e as más, diante de um poder
julgador, de origem divina, representado pelos deuses, ou de origem social
representada pelas leis cívicas, ou de fórum individual representado pela
consciência de cada um.
Uma vez que o homem, graças aos artifícios de amplificação
da sua força física tornou-se interventor
em larga escala sobre o seu ambiente, surgiu um mundo não natural, em que é possível
discutir as implicações éticas dos diversos aspectos de como essa intervenção é
feita.
Até que ponto o agir humano é natural, ou se é artificial,
ou é parte natural e parte artificial, propiciou o aparecimento de correntes de
pensamento divergentes, principalmente a partir da radicalização do “domínio da
natureza”, deflagrada pelo processo de industrialização.
Os movimentos ecológicos defendem a menor intervenção humana
possível, argumentando a finitude dos recursos naturais e responsabilizando o
homem por “crimes contra a natureza”.
Os capitalistas reagem de maneira oposta tentando
naturalizar as ações humanas, uma vez que, sendo o homem produto natural, suas
ações também o são.
As ciências biomédicas preconizam o uso ilimitado da
genética, em escala industrial, justificando que a busca do bem comum deve
superar antagonismos “puramente metafísicos”.
Longe de ser assunto de pacífico entendimento, o aprofundamento
da dicotomia humano/natural ensejou o aparecimento de uma ética particularizada
que contempla as ações morais do homem no seu permanente embate de conquista
dos recursos naturais: a bioética.
Apesar desses assuntos
não constituírem a raiz do debate em EN, propus-me a garimpar algumas passagens
onde Aristóteles constrói suas categorizações. É necessário que se pince os trechos
onde o autor assenta seus maiores temas, onde são estabelecidas relações e antagonismos
entre natural e convencional, natureza e bondade, necessidade e natureza, lei
humana e lei natural, natural e legal.
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A criação por Zeus e Hera |
Contrariamente à visão mecanicista em que a cosmogênese se
dá sob as leis do acaso, Aristóteles como panteísta, atribuiu-lhe origem divina.
“Se alguma coisa que os homens têm é um
presente dos deuses, é razoável supor que a felicidade seja uma graça divina, e
seguramente o mais divino de todos os bens humanos, porquanto ele é o melhor. (EN
1099 b 13)”, portanto se a felicidade tem origem divina, deduz-se que todos
os outros bens também o tenham.
Apesar do caráter dogmático que o mecanicismo assumiu na
ontologia ocidental, os pressupostos aristotélicos, juntamente com seu fulcro
deísta, jazem no âmago do senso comum.
Em áreas tão diversas como o direito, a educação, a medicina,
a genética, a sociologia, a história, a antropologia, as noções e delimitações
sobre natural e natureza se apropriaram tanto da herança de Aristóteles, que
assumiram o caráter de obviedades. Discutir o óbvio é lançar luz sobre as
profundezas de onde emergem as sombras que interferiram na gênese dos modelos
de homem, de mundo, de ciência e de ação moral, que são atualmente aceitos.
Por Isaias Malta
Edição: Gladis
Franck da Cunha
Referência
Bibliográfica
ARISTÓTELES. Ética a Nicômacos. Brasília: Editora Universidade de Brasília,
1985.
Embora nao concorde com tudo, pois acho o tema um pouco polemico, o texto esta excelente, muito bom mesmo.
ResponderExcluirParabens.
Te recomendo o livro Tábula Rasa de Steven Pinker para que revejas seus conceitos. Existem frutos que já nascem podres.
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