24 abril, 2010

Os Lipídios: alta diversidade de formas e funções.

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Os lipídios são o quarto grupo principal de constituintes celulares e são as moléculas orgânicas com a maior variedade estrutural. Ao contrário dos ácidos nucleicos, proteínas e açúcares eles não são poliméricos, porém tem alta capacidade de associação, por isso se agregam formando a base das membranas biológicas.

Dada sua alta diversidade pode-se estabelecer como característica geral dos lipídios o fato de serem moléculas hidrofóbicas, apenas levemente solúveis em água, o que as torna de difícil manuseio. Esta dificuldade de manuseio necessitou de avanços tecnológicos que permitissem sua análise bioquímica, assim, muitas de suas funções só foram elucidadas a partir de 1980.

Para a manutenção da vida, os lipídios desempenham três funções principais:
1- Formam bicamadas em ambiente aquoso, constituindo as membranas biológicas.

2- São as melhores moléculas para reserva energética, pois suas longas cadeias de hidrocarbonetos fornecem mais energia por unidade de massa, por serem menos oxidáveis do que os glicídios.

3- Muitos lipídios são moléculas usadas como sinalizadores tanto intracelulares como intercelulares. Um exemplo importante são os esteroides, como a testosterona ou similares, que “sinalizam o DNA”, ativando a síntese de alguns genes.

Que critérios são utilizados para classificar moléculas tão diversificadas? Afinal, o vem a ser um “lipídio”?

Uma molécula orgânica é classificada como lipídio quando for solúvel em solventes orgânicos como o clorofórmio e o metanol, sendo facilmente extraída de outros materiais biológicos na presença de tais solventes.

TIPOS DE LIPÍDIOS

A) Ácidos graxos: tais moléculas são constituídas apenas por átomos de Oxigênio (2), Carbono e Hidrogênio. Eles possuem um grupo carboxila (COOH) unido a grandes cadeias de hidrocarbonetos. Em geral os ácidos graxos possuem moléculas grandes com número de carbonos que variam entre 16C a 20C, pois moléculas com menos de 16 ou com mais de 20 carbonos são muito raras. Exemplos mais comuns: ácido esteárico; ácido oleico; ácido linoleico e ácido alfa-linolênico. Enquanto o ácido esteárico é um exemplo de ácido graxo saturado, sem duplas ligações, o oleico é insaturado e o alfa-linolênico é poli-insaturado, possuindo ligações duplas com configuração cis.
No ácidos graxos saturados, quanto maior a massa molecular maior a temperatura de fusão (Tf). Nos insaturados ou poli-insaturados, cada ligação dupla gera um ângulo de 30°, diminuindo a interação entre as moléculas de forma que ficam no estado líquido na temperatura ambiente.




A maioria das duplas ligações tem configuração Cis, mas há variantes, como podem ser vistos na figura abaixo, em que estão representados o ácido linolênico (9 e 12 cis) e o ácido linolênico conjugado (9 cis e 11 trans), mostrando duplas ligações em cis e trans respectivamente (SANHUEZA et al., 2002).

As propriedades das moléculas orgânicas dependem de suas conformações tridimensionais, assim, tem se evidenciado que as gorduras trans são mais danosas para saúde por inibirem a ação de enzimas hepáticas e modificarem a fluidez das membranas biológicas, entre outros efeitos. Todavia, para o ALC tem se verificado diversas propriedades favoráveis como seu efeito hipocolesterolêmico, sua ação imuno-estimulante ea proteção que oferece contra certos tipos de câncer (SANHUEZA et al., 2002).

B) TRIACILGLICERÓIS (triglicerídeos): são triésteres (C=O) do glicerol unidos a radicais de ácidos graxos.

Sua principal função é a de reserva, mas ao constituírem o tecido adiposo dos animais contribuem para sua função plástica e de isolamento térmico.
As gorduras e óleos da dieta são misturas complexas de triacilgliceróis. Como os trigliceróis são armazenados na forma anidra (sem água) sua massa relativa é bem menor do que o glicogênio que se associa às moléculas de água na proporção 1 g de glicogênio : 2 g de água, triplicando sua massa.


Assim sendo, cada grama de triglicerídeo fornece energia equivalente a 6 g de glicogênio.

Os triglicerídeos são sintetizados e armazenados nos adipócitos (ao lado) e sua reserva garante ao ser humano resistir a um jejum de dois a três meses.



C) GLICEROFOSFOLIPÍDEOS (fosfoglicerídeos ou fosfolipídios)
São os principais constituintes lipídicos das membranas biológicas. Formam-se pela união de dois ácidos graxos aos carbonos C1 e C2 do glicerol fosfato.

Os fosfolipídios são hidrolisados por Enzimas fosfolipases. Por exemplo, a fosfolipase A2 hidrolisa o radical do C2, formando um lisofosfolipídeo, que é um poderoso detergente. Em um organismo vivo isso resulta no rompimento da membrana plasmática e morte celular. Os venenos de algumas serpentes, bem como de abelhas são ricos em fosfolipases A2.

Analisemos a representação da estrutura da Fosfatidil colina (lecitina) um dos fosfolipídios de membranas biológicas (abaixo).

Observe que a porção polar da molécula se liga ao fosfato enquanto as caudas apolares se ligam aos carbonos C1 e C2. Ao carbono C2 está ligada uma cadeia insaturada e ao C1 uma cadeia saturada, de forma que as membranas biológicas têm uma fluidez intermediária entre as gorduras saturadas e insaturadas.

Além de constituir as membranas biológicas, os fosfolipídios são um dos principais componentes do surfactante pulmonar. O surfactante pulmonar é um líquido que reduz de forma significativa a tensão superficial dentro do alvéolo pulmonar, prevenindo o colapso durante a expiração. Consiste em 80% de fosfolípideos, 8% de lípidos e 12% de proteínas. A classe predominante de fosfolípideos é a dipalmitoilfosfatidilcolina (DPPC), além da fosfatidilcolina insaturada, fosfatidilglicerol e fosfatidilinositol. De todos esses, a DPPC, por si só, tem as propriedades de reduzir a tensão superficial alveolar, porém necessita das proteínas de surfactante e outros lipídeos para facilitar sua absorção na interfase ar-líquido.

D) ESFINGOLIPÍDEOS: são também importantes constituintes das membranas biológicas, mas por suas funções serem misteriosas, eles receberam este nome em homenagem a esfinge. A maioria é derivada do aminoálcool esfingosina, cujas ligações duplas possuem a configuração trans, sendo os seus derivados de ácidos graxos conhecidos como ceramidas.

Tipos de esfingolipídios:
1- Esfingomielinas compõem de 10 a 20% dos lipídios de membrana, mas na bainha de mielina são mais abundantes;

2- Cerebrosídeos são glicoesfingolipídeos e não contém grupos fosfatos, portanto são não-iônicos. Os galactocerebrosídeos e glicocerebrosídeos são os mais comuns;
3- Gangliosídeos: são glicoesfingolipídeos mais complexos formados por ceramidas ligadas a oligossacarídeos, são os componentes principais das membranas da superfície celular e compõe 6% dos lipídios cerebrais.

Há mais de 60 tipos cd gangliosídeos conhecidos. Eles atuam como receptores específicos para determinados hormônios glicoproteicos pituitários que regulam uma série de funções celulares, bem como estão relacionados à regulação do crescimento e diferenciação celular. Distúrbios na degradação de gangliosídeos são responsáveis por várias doenças hereditárias como a de Tay-Sachs (VOET et al., 2008).

E) ESTERÓIDES: são derivados do ciclopentanoperidrofenantreno um composto formado por 4 anéis não-planares fusionados.
Um exemplo é o colesterol, que é o esteroide mais abundante dos animais, sendo um componente majoritário das membranas plasmáticas, conferindo-lhes menor fluidez.


O colesterol é também o precursor dos hormônios esteroides, que regulam uma série de funções orgânicas. Exemplos de hormônios esteroides: cortisol - afeta o metabolismo de carboidratos; aldosternona - regula excreção de sal e água pelos rins; estrogênio e progesterona - regulam o desenvolvimento e função sexual.

Lipídios e sabões:
A produção de sabão é feita pela hidrólise de glicerídeos, originando sais de ácidos carboxílicos e glicerol. O sabão comum que utilizamos é uma mistura de sais de sódio ou potássio de ácidos graxos de cadeia longa, porque a gordura a partir da qual é preparado é constituída de uma mistura, e esta é tão eficiente para lavagem quanto um sal puro. A figura abaixo mostra a estrutura de uma molécula de sabão que possui uma região polar e uma cadeia apolar.


Leia também neste blog:
A estrutura da membrana plasmática
O tecido Adiposo

Referências e fontes de imagens:
1- BIOQUÍMICA: módulo 12 – disponível em: http://www.daanvanalten.nl/quimica/module12/bioquimica.html
 2- CAMPBELLl ; REESE, (2008). Biology, 8th Edition. Benjamin Cummings, San Francisco, CA. Disponível em: Cyndie’s Biology Home Page http://faculty.cbu.ca/cglogowski/2008%20BIOL101%20Biomolecules%20WS.htm
3- DUPLAT JR., Carlos, Gorduras e óleos Parte I. Duplat: Ensino de química e novas tecnologias. Disponível em: http://duplat.blogspot.com/2009/10/gorduras-e-oleos-parte-i.html
4- KRELL, A. Sabões e detergentes. Disponível em: http://www.members.tripod.com/alkimia/saboes_detergentes.htm
5- SANHUEZA, Julio C. ; NIETO, Susana K. ; VALENZUELA, Alfonso B. Acido Linoleico Conjugado: Un Acido Graso com Isomeria Trans Potencialmente Beneficioso. Rev. chil. nutr. v.29 n.2 Santiago ago. 2002. Versão on-line disponível em: http://www.scielo.cl/scielo.php?pid=s0717-75182002000200004&script=sci_arttext
6- SERIANNI, A. Chemistry 420 - Principles of Biochemistry. Disponível em: http://www.nd.edu/~aseriann/sphingo.html
7- TELES, D. ; CARVALHO, R. Sufactante pulmonar. Doutorbusca. Disponível em: http://www.digitalsub.com.br/doutorbusca/artigos/questionview2.asp?key=Sufactante+pulmonar
8- VÁZQUEZ-CONTRERAS, E. Esfingolipídios. Bioquímica y Biologia Molecular em Línea, 2003. Disponível em: http://laguna.fmedic.unam.mx/~evazquez/0403/esfingolipido.html
9-VOET, D. ; VOET, J. ; PRATT, J.W. Fundamentos de Bioquímica: a vida em nível molecular. 2ed. Porto Alegre : ARTMED, 2008.
10- Formação de triglicerídios: http://www.icb.ufmg.br/prodabi/prodabi3/grupos/grupo3/triacil.html
11- Glicerol - http://www.alonsoformula.com/organica_gal/mol33.htm
12- Colesterol tridimensional: http://www.worldofmolecules.com/disease/cholesterol.htm
13- Modelo da molécula de Colesterol por Wikipedia : http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Cholesterol_Spacefill.jpeg
15- UNIARARAS. Química. http://blog.uniararas.br/quimica/?cat=4&paged=2

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