Um encontro banal que fica marcado, um homem simples que deixa rastros indeléveis na memória por seu pouco falar, uma única frase que calou mais do que montanhas de palavras ouvidas de outras bocas, demonstrando que às vezes a eloquência do silêncio é a voz da alma.
Segunda-feira, abril de 2004. Geralmente neste dia da semana eu almoço no trabalho, começo as atividades da tarde muito cedo e o tempo é curto. Não existem muitas opções por perto, por isso as mesas são muito disputadas, e como aqui no sul não existe o hábito de conversarmos com quem conhecemos pouco, geralmente uma pessoa senta em uma mesa onde cabem quatro, consequentemente os outros três locais ficam teoricamente bloqueados.
Cheguei ao local um pouco antes do meio dia e não tive dificuldade em encontrar a “minha mesa”. Estava no início do almoço e vejo que vem um senhor a procura de um local para sentar. Ele tinha mais de 70 anos, alto, grisalho, já um tanto curvado. Quando percebi que todas as mesas estavam ocupadas, a maioria com uma pessoa, o convidei a sentar, e talvez por não haver outra opção, prontamente aceitou. Agradeceu, e pelo seu sotaque pude perceber que deveria ser de alguma cidade do interior, possivelmente de origem italiana. Tinha as mãos grandes onde o tempo se fazia presente pelos calos e juntas grossas. Começou a cortar a carne, e segurava os talheres de maneira muito simples.
Começou a comer e não falava nada. Para provocar alguma conversa, comentei sobre a seca que atinge toda região sul. A conversa se desenrolou ainda com poucas palavras, e pude confirmar que ele era de uma cidade de colonização italiana que fica a uns 100km de Porto Alegre. Era um agricultor simples do interior. Dando seguimento aos meus comentários, disse a ele: o homem tem controle sobre tantas coisas, mas não consegue nada em relação ao clima. Ele me olhou e falou: “imagina se controlasse” baixou a cabeça e continuou comendo. Não falamos mais nada. Pensei muito no que ele disse. Terminou o almoço, nos despedimos e fui trabalhar.
Posteriormente refletindo melhor, percebi que ele resumiu ali boa parte da natureza humana. O problema em si não é a tecnologia, mas a importância e o uso que se dá a ela. Imaginei empresas multinacionais detentoras da tecnologia que “dominasse” o clima. Umas com patente sobre o calor, outras sobre a chuva, outras sobre o frio, a neve, etc. Mais uma vez se faria presente o interesse econômico, que normalmente é de poucos e não haveria compartilhamento do benefício. Sou professor em uma universidade e a tecnologia tem um lugar de destaque, e não poderia se diferente. Felizmente nesta universidade também se discute a ética.
Acho que temos que estar abertos psicologicamente para aprender e não deixar que os nossos títulos e diplomas criem muros ao nosso redor, pois a vida é uma grande escola, e a nossa consciência não desperta em um instante, mas aos poucos. Para isso é importante estarmos atentos, pois às vezes nos vêm algum ensinamento de onde menos esperamos. Todos, as crianças, os velhos, os amigos, os desconhecidos, podem nos ensinar, desde que estejamos prontos para aprender. Que Deus ilumine seus corações!
Por: Marcus Franck
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